Recebi com imensa tristeza a notícia de que um menino de quatro anos chamado Leonardo perdeu a vida em um acidente próximo a Horseshoe Bay, aqui em West Vancouver. “Cada vez que um ônibus estava vindo ou o SkyTrain aparecia perto, meu pai me dizia: ‘Olha Leo… olha o ônibus… o ônibus’” — são palavras do menino, trazidas à vida postumamente por meio da carta de seu pai enlutado.
Pai e filho, ao que parece, compartilhavam o interesse pelo transporte público — uma alegria simples, um elo entre os dois — e é uma das ironias mais cruéis da vida que algo que tanto nos encanta possa também ser a origem de uma tragédia inimaginável.
Na dor, o pai encontrou uma forma profundamente comovente de expressar sua emoção: uma carta, escrita na voz de Leonardo. Você pode lê-la na íntegra aqui: GoFundMe –Leonardo’s Celebration of love. A mãe de Leonardo permanece em estado crítico, e a campanha arrecada fundos para seu tratamento.
Foi este pedido póstumo do pequeno Leonardo que me fez chorar:
“Primeiro, para ajudar com um pouco da dor, se a gente puder levar uma flor pros meus amigos que me levaram pra passear por essa cidade linda por quase 5 anos! Pergunta o nome deles, como estão! Compra um café se puder, porque eles são meus heróis! Se não for um motorista de ônibus, talvez um estranho na rua que precise de um sorriso ou um oi.”
Diante do luto, buscamos significado — e por significado, quero dizer uma maneira de reconciliar o que aconteceu, de suavizar o impacto, de encontrar alguma paz no insuportável. Alguns de nós recorremos a Deus, outros à raiva. Há quem procure a igreja, o álcool, o silêncio, a literatura, a poesia. Às vezes, no meio da dor, nasce arte. Às vezes, conseguimos fazer nossos entes queridos renascerem em voz, em memória, em gestos.
Essa carta é exatamente isso: um renascimento por amor. E o mais extraordinário é que ela ousa humanizar aquilo que está diretamente ligado à dor — o ônibus e, por extensão, o motorista. Fazer isso com ternura, em boa fé, no mais fundo do luto, é um gesto de força espiritual imensa. É algo que admiro profundamente.
O luto é a voz da separação. Pode ser a distância entre pais e um filho perdido, a ruptura de um casal, o desvanecer de uma amizade, ou até o afastamento de nossos próprios sonhos, quando a vida não acontece como esperávamos. Encontrar uma forma de desafiar o luto e sua realidade parece ser algo que todos nós sentimos como necessidade.
A essa família brasileira, envio meu mais sincero abraço. E que a beleza dessa carta brilhe mais forte que a dor dessa perda. Leonardo vive nesta epístola, em cada flor ofertada, em cada sorriso dado, em cada motorista agradecido.