A ordem natural das coisas dita
que primeiro nos aproximamos,
depois nos amamos,
e depois, categoricamente,
vamos nos separando.

As coisas, elas fogem pela tangente
infalivelmente, a entropia nos engole
por completo. Os amores vão fugindo
pelas membranas celulares da vida,
e vão sobrando as proteínas decaídas
da mundana existência dentro
do núcleo, do âmago,
codificado em ácido desoxirribonucleico.

E assim se explica o amor
no universo de Gabriel:
um processo bioquímico de alta beleza,
com meia-vida emocional instável,
cujo decaimento afeta todas as funções vitais —
dele e dos outros.
E quando, enfim, morre,
como as coisas morrem,
renasce a capacidade de escrever versos
moleculares.

Neste universo, existe erro experimental,
falhas sistêmicas do sistema,
a inevitabilidade do afastamento,
a entropia do afeto,
a morte celular causada por uma aberração peptídica
entre duas moléculas outrora cúmplices.

E os fótons viajam das estrelas mais distantes,
e excitam as outras moléculas, e elas se aproximam,
mas em Gabriel surgem mutações
desvantajosas. A seleção natural, por fim, o corta,
e restam as outras, mais bem-sucedidas
aleatoriedades dessa vida.

O universo, lendo o relatório,
assinou em silêncio a nota de rodapé
e seguiu girando.