Senhores!
Peço silêncio nessa espelunca sagrada.
Eu não vou rezar,
eu vou gritar uma memória maldita
que não me larga o peito nem com três doses e meio litro de esquecimento!
Por que — me respondam! —
por que eu não a abracei naquela noite?
Justo naquela, quando ela voltou uma última vez!
Sim, ela voltou!
Ela veio com aqueles… aqueles olhos de perdão,
embora já muito cansada,
com aquelas mãozinhas de redenção,
não tinha nem aquele maldito sorriso
que me ensinou a amar e me condenou à fome!
Eu, senhores — miserável!
Ah! Que miserável!—
estava no chão do banheiro!
Sim, caído como um cão sem dono,
patético como sempre fui!
E ela veio me buscar do abismo com um gesto,
mudo, derrotado também,
com aquela presença que só os desgraçados sabem reconhecer!
E eu… eu
que tive a tal da faca e do queijo na mão
eu, que pensava que seria o amante
mais maravilhoso desse universo
por não ser que nem os outros,
eu…
eu não fui.
Eu tremi.
Eu tremi muito
Meus amigos! Eu calei-me!!!!!
E assim, senhores —
assim perdi a última chance que me foi dada!
E hoje, oh céus embriagados,
revivo essa cena como um condenado revê o próprio crime!
A esquizofrenia vai comendo as entranhas da minha mente.
São muitas vozes hoje, são olhos nas paredes, a tremedeira,
os gestos incontroláveis, os gritos, berros, choros imensos.
O azulejo frio,
o reflexo torto no espelho,
o som da torneira,
as máquinas no teto,
um relógio que zomba de mim sem parar!
Por que, me digam,
por que essa mulher — esse veneno com nome e sobrenome
em duas línguas, ainda por cima, em duas línguas —
ainda me parasita os sonhos?
Por que não me deixa viver, nem beber, nem morrer em paz?
Eu a chamo de parasita, sim!
Mas ah!
Se ela entrasse por aquela porta imunda agora mesmo,
e dissesse:
“Vim. Agora vai."
— eu adoraria ir.
Eu, tolo, adoraria ir.
Mas agora eu estou muito doente para essas coisas bobas.
Então vamos beber.
Era isso, muito obrigado.